Quero um cachorro

Quando decidimos trazer um cachorro para nossa casa, não o devemos fazer de ânimo leve nem com pressas.

Nunca vi um cachorro com mais ou menos mês de vida que não fosse adorável, lindo e ternurento. Mas a realidade é que todos eles vão crescer e trazer-nos algumas surpresas.

Em primeiro lugar devemos analisar o nosso quotidiano e ter consciência do estilo de vida que temos, pois com mais ou menos passeios, com bom ou mau tempo, todos eles nos exigem disponibilidade. Não nos iludamos com a ideia de que nos vamos modificar em função do novo cachorro, porque essa ideia nunca se realizará. Também nós somos animais de hábitos e, por isso, conseguiremos adaptarmo-nos quanto muito durante um ou dois meses voltando, ao fim desse tempo, de uma forma insconsciente, à nossa rotina habitual.

Em segundo lugar devemos ter consciência do espaço que temos disponível para acomodar e instalar o cachorro. Para além de sabermos onde ele irá dormir (como, por exemplo, uma cama, um colchão, um estrado ou uma casota) temos previamente de ter consciência e decidir se ele vai ficar restrito ao interior de uma casa, varanda, terraço, quintal ou quinta. Quase todas as raças se adaptam de forma a viver em qualquer tipo de espaço, mas a realidade é que pode haver um preço a pagar por essa adaptação (quando não conseguimos ter as condições ideais e temos de conseguir compensá-los por isso). Existem três afirmações acerca do espaço necessário para ter um cão que gostaria de desmistificar: Muitos criadores de cães de raças grandes dizem habitualmente que os seus cães precisam de grandes quintais para que sejam equilibrados e felizes. Eu, que conheço muitos criadores, sei que grande parte deles tem os seus cães em canis de dimensões médias de 3X6 metros. A realidade é que qualquer apartamento T1 numa cidade tem uma área superior à área destes canis. Muitas pessoas dizem que os cães grandes precisam de mais espaço para viverem do que os pequenos. Para rebater este ponto, pensem que um cão nórdico como, por exemplo, um husky siberiano, tem de longe muito mais necessidade de espaço e de actividade física do que um São Bernardo (tendo em conta que um São Bernardo tem cerca de quatro vezes o tamanho de um husky!). Existe a ideia generalizada que os cães, em especial os grandes, precisam de viver ao ar livre para serem felizes.

Na minha actividade de treinador de cães, que já leva muitos anos, vi muitos mais cães felizes a viverem em apartamentos do que a viverem em quintais. Isto acontece porque os cães são animais de matilha, gregários, e olham para nós como membros do seu grupo. O que costumo ver são cães que vivem em apartamentos e que, sempre que os seus donos estão em casa, estão na sua companhia e por isso tendem a ficar mais felizes, equilibrados e estáveis. Por outro lado, muitos cães que vivem em quintais e que nem sequer podem entrar dentro de casa, vivem recebendo apenas uma carícia de manhã quando o dono sai para trabalhar e outra ao fim do dia, quando o dono regressa a casa. Estes animais tornam-se muitas vezes solitários, tristes e desequilibrados. Pessoalmente penso que a situação ideal seria aquela em que os nossos cães têm um espaço exterior onde estar e simultaneamente têm acesso ao interior da casa para usufruírem da companhia dos seus donos quando estes estão em casa.

Os cães que vivem em apartamento podem ser perfeitamente felizes e equilibrados se os donos derem passeios diários com eles e lhes proporcionarem quantidades diárias de exercício necessário em função de cada raça. Acreditem que um cão de raça Terra Nova, ou um de raça Dogue de Bordéus, têm menos necessidade de exercício diário do que um galguito italiano ou um husky, necessitando os primeiros de passeios mais pequenos e tranquilos do que os segundos. Quero aproveitar para lamentar as situações, infelizmente demasiadamente vistas, de pessoas civilizadas que no século XXI ainda têm coragem de ter estes nossos amigos, que tudo nos dão e que nada regateiam, presos em varandas ou acorrentados em quintais dias a fio, quando não toda a vida. Em terceiro lugar, temos de pensar muito bem que tipo de cão melhor se adapta ao nosso quotidiano.

Prefiram sempre escolher o vosso companheiro mais pelas suas características físicas e psicológicas, do que pela sua beleza. A primeira etapa neste campo prende-se com a decisão de se optar por um cão de raça indeterminada (vulgarmente chamados rafeiros), ou por um cão de raça bem definida. Se optarmos pelos segundos, será mais fácil saber com o que se contar na sua fase adulta, enquanto que no primeiro caso é uma incógnita. Pensemos que vamos conviver com o nosso cão entre 9 a 16 anos, em função da sua raça e tamanho. Por isso, a decisão que vamos tomar é uma decisão de longo prazo.

Então, como vamos escolher o nosso cachorro? Se a nossa opção for a de escolhermos um cão sem raça definida, é um tiro no escuro que vamos dar, pois nunca saberemos previamente qual será o seu padrão de comportamento e aspecto físico. O máximo que poderemos fazer é olhar para os pais (se forem conhecidos) e imaginar como serão os filhos. No entanto, é sem dúvida meritório que se opte por adoptar cães sem raça, muitas vezes abandonados... Merecem tanto o nosso carinho como qualquer cão de raça. Se optarmos por um cão de raça definida, deveremos escolher a raça que melhor se adapta a nós. Em primeiro lugar, deveremos analisar se as características da raça se adaptam ao nosso estilo de vida, como por exemplo, saber se é um cão hiperactivo, activo, moderado ou um dorminhoco; se se dará bem com estranhos ou se é desconfiado; como é que se dará com crianças; que peso e tamanho terá; que quantidade de alimento necessitará em adulto; como será o seu pêlo; etc. Em relação ao pêlo, chamo a atenção para o facto de que, normalmente, os cães com pêlo comprido dão mais trabalho para serem escovados, enquanto que os cães de pêlo curto tendem, por sua vez, a deixar cair mais pêlo. Existem ainda algumas raças (raras) que têm pêlo hipoalergénico o que em alguns casos é uma vantagem para algumas famílias, quando existem problemas de alergias. Temos também de conhecer as maiores e menores dificuldades que cada raça apresenta para a sua educação. Só depois de termos feito todo este percurso, é que estaremos aptos a saber qual o cão ideal para nós e para a nossa família. Antes de o adquirirmos, devemos ainda ir falar com especialistas e criadores para confirmarmos a nossa decisão.

No fim tudo se resume a encontrarmos as condições para que nasça uma excelente relação de companheirismo por muitos e bons anos.

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